
Festa da Exaltação da Santa Cruz
15-09-2025Tudo na vida está marcado pela cruz, por uma realidade e sensação que torna a vida desconfortável, pesada, mais ou menos arreliadora, insuportável. Por onde quer que vamos, sempre nos acompanha, sempre nos rodeia a cruz dos outros, que se junta à nossa. Recordo ter lido que “um homem enlouqueceu com a mania de não pisar a cruz ao andar, nomeadamente, as dos calceteiros, que a pavimentaram. Caminhava em bicos de pé ou em pequenos saltos para evitar a profanação de pisar a cruz, porque as lousas, os azulejos, o parquê do pavimento, um inevitável cruzamento de linhas desenhavam continuamente inumeráveis cruzes”. Que trágica cruz para não pisar cruzes!…
Perigosa mania porque, efectivamente, não se pode dar um passo pelo mundo sem tropeçar, sem pisar uma cruz.
Todas as coisas que na vida nos proporcionam satisfação, alegria ou prazer, por são e elementar que este seja trazem visível ou escondida a marca da fábrica – uma pequena cruz. Tudo: – a rosa e o pão, a nota do banco, a joia, o salário corrente e a cobrança abundante dos dividendos, tudo é filho da nossa dor, da nossa cruz, tudo adquirimos ou compramos com o “made in dor”.
Por isso, umas vezes mais outras menos, a nossa cruz torna-se insuportável. Queremos ver-nos livres dela. A pior táctica é a revolta e lutar contra a cruz é inútil. Ela defende-se ferozmente contra os nossos intentos e sempre nos vence. É como combater contra um gigante.
Por aquilo que eu próprio tenho observado, sobretudo, naqueles em que o peso da cruz deixa sulcos mais vincados, quem assim procede acaba duplamente crucificado. Por mais incrível que pareça, quem pretender desfazer-se da sua cruz, parti-la, verificará que os pedaços soltos voltarão vivos, a soldar-se. Quem procura enterrá-la, abafá-la com o álcool, com a droga, por exemplo, vê-la-á ressuscitada, imortal, milhares de vezes. Quem com um sorriso forçado ou com a base da maquilhagem procura escondê-la, disfarçá-la, encontrá-la-á sempre com traços ainda mais vivos e mais marcantes.
Esta cruz é sempre um suplício, um castigo, um opróbrio, porque é uma cruz solitária. Esta é e sempre foi a cruz dos homens. Entretanto, a reflexão deste domingo fez-me reconhecer que o Filho de Deus não tem cruz. Mas, quando os homens lhe deram uma cruz, semelhante àquela que inventaram uns para os outros, Jesus cravou-se nela para a transformar no maior sinal do seu amor por todos os que suportam uma cruz, e assim fazer dela um sinal de salvação, de libertação.
De facto, a única força capaz de vencer a cruz é o amor. Mas, para que tal aconteça, é necessário que na cruz, na vida de cada um de nós esteja Cristo.