
Solenidade do Natal do Senhor
25-12-2025Sempre me causou um certo incómodo ouvir alguém dizer que “Natal é quando o homem quer”. Esta afirmação tem o seu peso de verdade porque, para haver Natal – incarnação de Deus na vida do homem – é indiscutível a necessidade de que ele contribua para isso, à semelhança do que fez Maria. Mas, duvido que quem diz ou canta o que referi esteja a pensar nisso. Talvez queira referir-se a uma certa ambiência, que exprima o sonho de um mundo com que todos ambicionamos: – de harmonia, bem-estar, concórdia, paz, abundância, alegria… Tudo isto é bom que o homem sonhe, mas para ser realizado ele tem de mudar o seu coração, abrindo-o a Deus que é a única fonte do Bem, do Belo e do Bom. De outra forma, o gozo será meramente superficial e efémero, como uma nuvem que passa.
A isto junto o que encontro no profeta Isaías, que também sonhava algo de semelhante a respeito de Jerusalém: “Como são belos sobre os montes os pés do Mensageiro que anuncia a paz, que traz a boa nova”. O profeta observou melhor e notava as sentinelas, que do alto das muralhas, perscrutavam ao longe quem inesperadamente corria a anunciar a notícia de que chegavam em coluna os exilados da Babilónia. À frente vem o Senhor. É Ele que reconduz o seu povo a Jerusalém. Numa visão, Ezequiel tinha-O visto afastar-se da cidade Santa, destruída e a acompanhar o seu povo para o exílio.
Então, eis que regressam juntos. A escravidão acabou, os sofrimentos e a humilhação terminaram. Os que oprimiram e exploraram o seu povo desapareceram para sempre. Inicia-se uma nova era, um novo reino, onde o Senhor se colocará à frente do seu povo, com firmeza. Por isso, acrescenta o profeta: “Levantai vossas cabeças, rompei brados de alegria, é chegado o vosso Rei”.
E que deu o sonho? De facto, um grupo de exilados da Babilónia chegaram a Jerusalém. Mas foi para eles uma grande desilusão, na medida em que esperando que Deus a tivesse reconstruido, nela encontrassem quem os acolhesse de braços abertos, numa expressão de alegria e de triunfo, viram a cidade ainda em ruínas, o desinteresse e até a hostilidade dos que nela residiam. O profeta ter-se-ia enganado?
O povo começou a entender que as palavras de Isaías sobre a libertação, que Deus queria realizar, deveriam ser entendidas de outra maneira: Deus não iria pôr a sua força à disposição dos sonhos de glória, acalentados pelo seu povo. Era necessário um outro regresso: – para o povo gozar de tal alegria era necessário o regresso do coração ao seu Deus. Esta é que era e é a condição indispensável para o homem encontrar a felicidade com que sonha e para o que foi criado. Face a isto, deixo-vos esta mensagem de S. Agostinho, que eu julgo ser a melhor forma do que vos disse até aqui: “Tarde Vos amei, ó beleza tão antiga e tão nova. Tarde Vos amei. Vós estáveis dentro de mim, mas eu estava fora e fora de mim Vos procurava. Com o meu espírito deformado precipitava-me sobre as coisas formosas que criastes. Estáveis comigo e eu não estava conVosco. Retinha-me longe de Vós aquilo que não existiria se não existisse em Vós.
Chamastes, clamastes e rompestes a minha surdez. Brilhastes, resplandecestes e dissipastes a minha cegueira. Exaltastes sobre mim o Vosso perfume: – aspirei-o profundamente, e agora suspiro por Vós. Saboreei-Vos e tenho fome e sede de Vós. Tocaste-me e agora desejo ardentemente a vossa paz”.
É este sonho de paz e de alegria, cantado pelos pastores em Belém, que desejo para vós e para a vossa família. Feliz Natal




